sábado, 2 de maio de 2015

Mãos

Olá leitores do Livro Velho & Poesia.
É sempre um prazer poder dividir com vocês os meus "escritos", se é que posso chamá-los assim, é engraçado como a cada dia que passa escrever vai se tornando mais essencial pra mim. Descobrir-me através da poesia foi um achado, poder me encontrar nos textos de Clarice, Drummond e outros grandes foi realmente importante nessa minha construção desconstruída.
Não acredito em escritor construído, feito, na verdade não acredito em artista feito. Clarice não se considerava uma escritora profissional, pois só escrevia quando queria, estava sempre na busca de algo e o fato de estar sempre na busca a fez ser essa artista que tanto nos identificamos. Fernanda Montenegro rejeita ser chamada de "Grande Dama do Teatro" identifica-se a si mesmo como "atriz" que é o que ela é, sendo assim não posso, recuso-me, ser chamado de escritor, pobre de mim, ainda aprendendo a grandeza das letras, o poder transformador das palavras, estou então em uma construção desconstruída de mim mesmo. 

Mãos. Acho que sempre tive grande fascínio por mãos, hoje, olhando para trás é nítido o modo como eu observava atentamente o modo como o professor passava o giz na lousa, a forma como desenhava as palavras, e como eu conseguia reproduzir a letra igualmente, a forma como ele manuseava os livros, cadernos... Esse manuseio, o tocar, sempre me prendeu atenção de alguma forma.
As mãos, é sem dúvida a parte do corpo que mais tenho admiração, um fascínio. Sempre gostei de observar pessoas escrevendo, mesmo antes de saber escrever. Sempre apreciei olhar para as mãos.
E esse fascínio cresceu quando eu descobri que livros não nascem em árvores, que há alguém por trás deles, admirar as mãos de grandes escritores, notórias atrizes, grandes artistas em si é algo que guardava muito pra mim e hoje compartilho com todos vocês...

A mão direita de Clarice era queimada, sem querer a escritora provocou um incêndio ao dormir e esquecer seu cigarro acesso, em 14 de setembro de 1966, seu quarto fica destruído e ela é hospitalizada entre a vida e a morte por três dias. Sua mão direita é quase amputada devido aos ferimentos,

Que grande encanto é as mãos.
Jovens, velhas, enrugadas ou não.
Mãos que escrevem que acalentam
Mãos que seguram...
E deixam cair.

Mãos queimadas.
Que nem mesmo o fogo conseguiu esbrasear sua graça e beleza.

Mãos cicatrizadas. Troféus do tempo.
Mostrando aos mais moços, as marcas que a vida dá aos mais fortes.

Mãos é a formosura do corpo.
Ah, que doce encanto é as mãos:
Do escritor, do poeta, do professor, do lavrador, do protetor.

Mãos.
Sujas de giz, de barro, de cuidados.

A mão da mãe: doce, terna e complacente.
A mão que fala.
E que toca no outro.


Mãos que nos trazem paz.

Autoria: Charles Nascimento

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Dor


Sinto dores, e a maior parte do tempo é dor. Quero anestesiar-me, esvanecer.
Esvaecer.

Não há rota, não há fuga! A dor me é constante, firme e imutável. Crônica.
Morro da dor e renasço do anseio de prosseguir vivendo, vivendo pra que? Para a dor.

Levanto-me e tomo um comprimido. Pego um livro.
Quem sabe a fuga das palavras não me distancia por um tempo da dor?

É fútil, ledo engano, irrito-me, jogo o livro de lado, eu não sei onde há dor.
Mas, eu sinto.

Há dor no invisível. No inaudível. Há dor. Pego então meu caderno de anotações.
Muitos registros. Nada escrito.

Quero colocar para fora as minhas dores, as palavras é minha válvula de escape.
Mas, eu sei não há escape na dor. E eu fujo. De mim mesmo. Por que estou cansado.

Morfina? Ópio dos que sentem dor. Quero dormir.
É inútil. É inútil dormir. A dor não passa.

A dor resiste, persiste. É-me estranho.

"Como é estranha a natureza morta dos que não sentem dor.
Como é estéril a certeza de quem vive sem amor..."
Completamente Blue, Cazuza.

Texto: Charles Nascimento

quinta-feira, 30 de abril de 2015

O tempo


Falta-me o tempo...
E o que é o tempo, senão, o que determina os momentos, os períodos, as épocas, as horas, os dias, as semanas, os séculos...
O que é o tempo, senão, aquele que leva consigo a juventude, o vigor, a força e a coragem.

Falta-me o tempo...
Tempo para amar, navegar e viver.
Sobreviver.

Há quem diga que o tempo é o melhor remédio, droga, é que o tempo não tem bula.
Como então saber suas contra-indicações?
Como tomar a dose certa do tempo?

Quanto tempo o tempo ainda tem?
Diga-me, há tempo para ter tempo?
Quisera eu, ter tempo para um cochilo.

Não há mais tempo...
Viver não é preciso.

"Eu morro ontem/ nasço amanhã/ Ando onde há espaço/ O meu tempo.../ é quando."
Poética, Vinicius de Moraes.

Texto: Charles Nascimento.

quarta-feira, 11 de março de 2015

Provavelmente


Provavelmente pode acontecer; mas é tudo pouco provável, um talvez.

E nesse dilema entre a certeza e o talvez, é que mora o pior de todos os inimigos: a insegurança. Contudo, meu bem no amor não deveria haver incertezas.

Eu te amo! É a mais clara das fiúzas.

E quando eu digo: “Fica comigo” é uma afirmativa, dizendo que o meu coração quer fazer morada no teu.

Provavelmente tu não vens hoje. Mas, caso venhas, saiba que estarei aqui te esperando, garrafa de vinho e taças postas; mas olhe meu bem, se não vem fique tranqüilo, pois não espero por mais ninguém.

Esperar é doloroso sabe? Cansativo, irritante. É a espera que esfria o café, que estraga o jantar, que apaga as velas e faz com que o amor se debele. Ah, é a espera que faz com que o caramelo passe do ponto. É provavelmente a ação mais inerte que há.

E nesses muitos “provavelmente” quiçá eu conheça alguém. Um que tenha certeza, que fique comigo, que faça do meu peito moradia fixa e da minha boca residência de aluguel. Um alguém que chegue no horário, que me traga um cd de Nara.

Nota: Nara Leão, que fique claro.

Um alguém que entenda das minhas desestruturas românticas, dos meus devaneios intensos, da minha inquietude constante...

Um alguém que no fim da vida, olhe os céus e agradeça a Deus por eu ter feito parte dela e que feneça sorrindo sabendo, pois que um dia o amor também lhe sorriu...


Provavelmente...

(texto: Charles Nascimento)

domingo, 8 de março de 2015

O que é a Vida?


Um dia, contemplando a maestria do céu, sozinha de companhia humana, escoltada de vinho e cd de Bethânia eu me questionei sobre o que é a vida e naquele momento eu não sabia mais o que era viver.

Sentia em mim uma dor flagelada assintomática e cruel. Era a vida cobrando de mim o seu trocado, queria eu poder entender o significado de algo, era uma constante puérpera que não desfrutara do prazer da maternidade, sofrendo de modificações físicas e psíquicas como um vaso na mão de um velho oleiro, era eu refletida naquelas águas, era a vida tomando de mim o que eu não podia lhe dar.

Naqueles momentos de constante inconstância do meu eu, era apropriado que eu me despisse de todos os preceitos e convencionalismos para não dizer, preconceitos em mim enraizados e repensasse o quão bom é ainda estar aqui, viva ou não, não eu não estou falando de morte, hoje não quero falar de morte, saiba você que há pessoas vivas que não sentem, não sofre, não estão em coma, não estão em estado vegetativo, há pessoas por ai caminhando, trabalhando, pensando amar e pensando estar sendo amada, mas que não está viva, isso porque não entendeu o significado dessa infeliz palavra...

Eu sentia o gosto do vinho tocando o céu da boca, eu sentia as canções entrarem em mim como facadas. Eu. Eu. Que peso carrega essas duas letras. Eu. Quer mesmo saber? Eu sentia tudo e já não experimentava nada, tudo era novo e ao mesmo tempo não havia novidade, não mais havia existido amor, tragédia nem romance, estava eu ali somente a procura do significado real que nenhum dicionário poderia me dar à resposta.

Tantas respostas para tantas perguntas...

Indicaram-me então um ótimo terapeuta, diziam que ele iria me curar, não sei como e por que, mas ele curou. Se curou daquele temporal que o havia inundado tempos atrás. Curou do medo de liberdade que o mesmo havia saboreado na doce infância, e não mais havia experimentado.

Curou. Que palavra estranha para ser degustada.


Dizia a mim sessão após sessão que enfim estava descobrindo o que era vida, maldito! Quem pode com ela? Na busca incessante de descobrir os mistérios da vida, descobri que por ora que não havia mais...

(texto: Charles Nascimento)